"Fonoaudiologia é uma arte que merece ser mais amplamente conhecida. Você não pode imaginar as acrobacias que sua língua mecanicamente executa para produzir todos os sons da linguagem”, Jean Dominique Bauby, foi Editor Chefe da Revista ELLE em Paris, após ter um AVE e precisar de tratamento fonoaudiológico.

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quarta-feira, 9 de março de 2011

(Parte II) Doença de Parkinson, o que todo cuidador deve saber

Baseada na minha experiência lidando com a minha vó, portadora da Doença de Parkinson (DP), atendendo pacientes com este diagnóstico no Centro Clínico de Fonoaudiologia da Puc Minas (Belo Horizonte, MG) e, participando do Grupo de Parkinson do Centro de Referência em Reabilitação Anderson Gomes (Betim, MG) quero dar alguns conselhos em tópicos que podem facilitar a vida do cuidador e ajudar a melhorar a vida da pessoa portadora desta doença. Se você também tem uma experiência profissional ou pessoal para adicionar à esta lista, compartilhe conosco deixando um comentário! Obrigada :)

16 dicas sobre "Como lidar"

1. Não trate a pessoa como criança, e isso vale para lidar com qualquer idoso. Evite diminutivos, por exemplo: "vamos comer essa comidinha", "quer tomar um banhozinho?"
2. Não use o termo Mal de Parkinson, diga Doença de Parkinson.
3. Ofereça os medicamentos no horário certo, seja consistente.
4. A face em máscara faz parte da DP, não ache que o portador está mal humorado ou está lhe ignorando. Estimule os sorrisos, de maneira natural, para isso basta levar a vida com humor e alegria!
5. Não peça para o portador se apressar. Devagar e sempre! A lentidão de movimentos faz parte do quadro.
6. Os efeitos da medicação podem ser intermitentes, ou seja, podem funcionar em determinados períodos (on) e em outros não (off). Estabeleça horários para as atividades de vida diária quando o portador estiver sob o efeito da medicação, por exemplo: comer, tomar banho, sair, fazer os exercícios terapêuticos, em especial os fonoaudiológicos ;o)
7. Se o portador parecer congelado ou anestesiado ou prostado, tente o seguinte: mudar o peso do corpo de um lado para o outro, marchar parado no mesmo lugar, pisar em uma linha imaginária, cutucar gentilmente o braço, contar os passos em um espaço delimitado, dançar com ele sentado na cadeira;
8. Comunique ao médico todas as mudanças de atitude, personalidade e de funções (comer, respirar, andar, etc);
9. Una a família, demonstre o apoio!
10. Conte casos de pessoas com a doença que estão vivendo bem!
11. Não permita o isolamento do portador de DP, em especial nas reuniões familiares e no momento de alimentar-se. A princípio ele poderá se sentir constrangido, tanto pela dificudade com a coordenação motora fina, quanto por necessitar comer em uma consistência diferente e demorar mais que os demais. Leve a situação naturalmente e sempre com bom humor. 
12. Ao oferecer alimento (e isso vale para todos), ajude o portador a manter a postura ereta e não ofereça alimento quando estiver deitado.
13. Não ofereça água, caso a pessoa engasgue. Estimule a tosse ou dê "tapinhas" nas costas.
14. Mantenha-se sempre bem informado, para discutir as melhores alternativas de tratamento com a equipe multiprofissional.
14. Lide com a doença da maneira mais positiva possível, afinal a Doença de Parkinson não tem cura, mas tem tratamento eficaz!
15. Discuta com o médico responsável a eficácia e a indicação de terapias alternativas! Cuidado com as sugestões que ouvir sobre tratamentos alternativos, muitos deles não tem comprovação científica e podem comprometer a saúde do portador de DP!
16. Leia e tenha em casa uma cópia do Guia Prático do Cuidador, elaborado pela Associação Brasil Parkinson. Para fazer o download acesse o link: Download Guia Prático do Cuidador.

domingo, 6 de março de 2011

Doença de Parkinson, o que todo cuidador deve saber

Minha vó está com Parkinson. Ontem fizemos uma reunião em família para esclarecermos o quadro e organizarmos a dinâmica familiar, pois precisamos estar preparados para ajudá-la, em especial para ajudá-la a etender o que está acontecendo com ela. Uma família estruturada é uma aliada no tratamento da Doença de Parkinson e, por isso, a minha primeira sugestão é que, se você está passando por uma situação com esta, você reúna a família para falar sobre a Doença de Parkinson e tomar as medidas necessárias para garantir qualidade de vida para o seu ente querido: organização da rotina, definição de atividades, planejamento financeiro, escolha do tratamento, adequação do ambiente, entre outros.

Como a única da família que trabalha na área da saúde - por enquanto, felizmente temos dois médicos, uma nutricionista e um dentista a caminho - minha parte foi esclarecer o quadro para os demais. Também me prontifiquei a comparacer nas consultas, em especial na fase de diagnóstico, para discutir com os médicos as melhores alternativas de tratamento. Se na sua família não existe alguém que trabalhe na área da saúde, eleja uma pessoa bem articulada para conversar com o médico, o neurologista ou geriatra, para esclarecer o quadro e passar todas as informações para os demais. Lembrando que o neurologista é o "profissional chefe" no tratamento da doença de Parkinson. O geriatra, no caso da minha avó, é também um aliado  muito importante, pois além da doença de Parkinson ela apresenta outras doenças associadas (por exemplo, hipertensão arterial e pulmonar). Este profissioanl ajuda a "gerenciar" tudo que está se passando com ela. A escolha de um bom geriatra para acompanhar o caso é a minha segunda sugestão.

Enfim, você precisa saber o que é a Doença de Parkinson (DP), e, por favor, não é "Mal de Parkinson"  - essa nomeclatura não é mais utilizada pois traz uma conotação negativa ao quadro! 


Conceito


Você também já pode ter ouvido falar o termo Parkinsonismo, que é simplesmente um distúrbio do movimento, sendo este o sintoma mais comum do portador da DP. A DP é a segunda doença neurodegenerativa mais comum no mundo, ficando atrás apenas do Alzheimer; quando digo que é neuro-degenerativa, quero dizer que gradativamente o grau de severidade da doença aumenta e o portador gradativamente se torna mais dependente. A DP  é resultado de uma degeneração dos neurônios da substância negra (uma parte do cérebro) levando à consequente deficiência de um neurotransmissor chamado dopamina, que regula, dentre outras funções, o controle motor do corpo.

Ocorrência


A DP normalmente é diagnosticada no portador com 50-60 anos de idade, é incomum a doença em indivíduos mais novos que 40 anos. A incidência é maior entre homens, do que mulheres. A origem da doença é genética, tendo sido identificados aproximadamente 10 genes autossômicos e recessivos associados à DP. Isso não significa necessariamente que a doença é hereditária, estimou-se que apenas 10-15% de familiares de primeiro ou segundo grau poderão desenvolver a doença. Fatores ambientais que podem causar a doença ainda não foram definidos.

Sintomatologia


A DP é definida pela seguinte quatríade (4) sintomas: rigidez, que é a resistência à movimentação passiva das articulações; bradicinesia ou acinesia, que é a lentidão e escassez de movimentos; tremor, que aparece quando o membro está em repouso; e instabilidade postural, que é dificuldade de manter a postura ereta tendendo a deixar a coluna cair para um lado, sendo este um sintoma tardio. 

Normalmente, os sintomas aparecem primeiro de um lado e depois do outro, sugerindo uma hemiparesia leve. Nos estágios iniciais o portador de DP encontra dificuldade de locomoção, andar torna-se mais lento, e é comum andar arrastando um dos pés e movimentar menos o braço do lado comprometido. Também é comum o portador queixar de dificuldade de sair de carros, levantar de assentos profundos, e rolar na cama. 

Dentre os sintomas da DP, o tremor é o mais lembrado. Esse tremor é bem característico, distinguindo-se de demais tremores por causas adversas, por exemplo emocional. No caso da DP, o tremor acontece caracteristicamente na língua, na mandíbula, na maxila. Este também compromete a coordenação motora fina e a escrita se torna irregular e pequena.

A DP também pode ser nítida pelas características da face: um rosto sem expressão, com pouco ou nenhum senso de animação. Esse quadro é denominado face em máscara, pois é uma cara mais parecida com uma máscara do que com um rosto real. Por essas e outras o exame clínico e o conhecimento da história e queixas do paciente são suficientes para dar o diagnóstico; não existem exames laboratoriais ou de imagem para confirmar o diagnóstico. Às vezes, uma ressonância nuclear magnética pode ser solicitada para excluir demais condições.

Em relação à comunicação, o portador da DP apresenta a voz "baixinha" e a articulação das palavras dificultada. Como fonoaudióloga, eu posso falar bem desta parte. O quadro é definido como disartrofonia: fala monótona, inteligibilidade reduzida, articulação imprecisa, hipofonia. Este quadro já está presente na minha vó, que também se queixa de dificuldade de engolir e de "babar" muito.

A sialorréia, que é o termo utilizado para o excesso de baba, ocorre por causa de outro sintoma fonoaudiológico, a disfagia, que é o distúrbio da deglutição. Caso ocorra disfagia, este sintoma precisa ser tratado com acompanhamento fonoaudiológico, para impedir a ocorrência de pneumonias, engasgos e até sufocamento. Exatamente pela fraqueza da musculatura, em especial  da língua e da laringe, engolir a saliva e comer tornam-se funções difíceis. À saber aos fonoaudiólogos leitores desta postagem: detecta-se, principalmente, estase alimentar na fase oral e disfunção do músculo cricofaríngeo. Normalmente, este quadro não está associado ao início da doença, é mais ocorrer nos níveis IV e V da Doença de Parkinson.


Estágios da Doença de Parkinson

Você precisa saber dos estágios da DP. São cinco os estágios da doença, que variam de acordo com a severidade do quadro, tendo o nível V como mais severo. Veja o quadro.


Tratamento

O diagnóstico de doença degenerativa não significa que o portador e/ ou cuidador irão simplesmente assistir a evolução descontrolada da mesma. A DP, apesar de não ter cura, tem tratamento. Eu acredito que a conduta mais importante do cuidador é apoiar e esclarecer o portador da DP, em especial quando é dado o diagnóstico. Ele precisa entender que o a Doença de Parkinson tem um curso ao longo de décadas, sendo que a taxa de progressão, ou seja a evolução quanto ao nível da doença, varia muito de pessoa para pessoa. Posso citar exemplos de pessoas famosas que há muitos anos vivem, muito bem, com a doença: no Brasil, o ator Paulo José; no mundo, o ator Michael J. Fox. O papa João Paulo II conviveu muitos anos com a DP.

a) Não farmacológico

Várias abordagens de tratamento estão disponíveis para reduzir os sintomas. Uma das abordagens que eu indico são os grupos e associações de suporte aos portadores e ao cuidador.  Eu trabalhei com um grupo de Parkinson em 2006, quando fui estagiária do Setor de Neurologia Adulto do Centro de Referência em Reabilitação Anderson Gomes, em Betim - MG. Foi uma experiência sensacional! Eu vou procurar saber se este grupo ainda existe e se posso incluir a minha avó! Existem dois tipos de grupos: os  de portadores, que podem compartilhar as experiências, realizar exercícios terapêuticos e atividades de lazer em conjunto; e os de cuidadores, que também compartilham experiências entre si e são orientados sobre como cuidar do portador da DP. É importante ressaltar que os grupos que incluem pacientes em estágios mais avançados da doença podem assustar e não serem úteis aos portadores que foram recém diagnosticados.

Diversos profissionais podem ajudar a garantir qualidade de vida ao portador de DP, minimizando os sintomas, re-abilitando-o para realizar as tarefas de vida diária e ter melhor controle sobre o próprio corpo. Dentre eles, ressalto os fisioterapeutas, nutricionistas, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos. Procure estes profissionais para avaliação e orientações, lembrando que não necessariamente o portador precisará de atendimento sistemático no momento que for feito o diagnóstico. Terapias alternativas também podem ser incluídas. O neurologista da minha avó recomendou para ela, por exemplo, a hidroginástica.

b) Farmacológico

Em relação ao tratamento medicamentoso, um dos artigos (Nutt JG,  Wotten GF. Diagnosis and initial management of Parkinson's disease. N Engl J Med 2005;353:1021-7) que me baseio para escrever esta postagem  coloca muito bem que não necessariamente o diagnóstico da DP preconiza o início da ingestão de medicamentos. O uso destes é recomendado, sob orientação médica, quando o portador está suficientemente incomodado pelos sintomas e deseja a medicação ou quando a doença já está produzindo deficiência. A vontade do portador é uma condição crítica para que seja tomada esta decisão. 

Comumente, o tratamento inicial inclui levodopa, uma droga precursora da dopamina. O objetivo de utilizar a levodopa é realizar a reposição dopaminérgica, ou seja, repor a dopamina que o cérebro não produz mais. Fala-se também da utilização de agonistas dopaminérgicos, ao invés da utilização do levodopa, pois apesar da levodopa ser considerada o tratamento mais eficaz, efeitos colaterais e complicações são comuns no tratamento a longo prazo, dentre eles flutuações do quadro motor e distúrbios neuropsiquiátricos. Agora que eu pesquisei sobre o tratamento farmacológico para a DP, em especial as controvérsias sobre o uso da levodopa, eu quero conversar com o neurologista para ver qual é a melhor medicação e recomendo que você faça o mesmo. Acredito que esta seja uma escolha pessoal e, reafirmo, o tratamento medicamentoso é feito de acordo com a orientação médica e varia de indivíduo para indivíduo.





Fontes