"Fonoaudiologia é uma arte que merece ser mais amplamente conhecida. Você não pode imaginar as acrobacias que sua língua mecanicamente executa para produzir todos os sons da linguagem”, Jean Dominique Bauby, foi Editor Chefe da Revista ELLE em Paris, após ter um AVE e precisar de tratamento fonoaudiológico.

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quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Um caso peculiar de disfagia




O periódico The New England Journal of Medicine selecionou a imagem acima como a IMAGEM DA SEMANA. Trata-se de uma radiografia tirada de um paciente, sexo masculino, 50 anos, acometido no departamento de emergência de um hospital com definida DISFAGIA, dispneia, e tosse paroxismal. Ele engoliu uma colher de sopa, ao tentar extrair um espinho de peixe que, segundo ele, estava parado na região da laringe. Com o paciente sob efeitos de anestesia geral e com a ajuda de um laringoscópio, a ponta da colher foi coletada com um auxílio de forceps e seguramente extraída. Não foi encontrado qualquer vestígio de espinho de peixe na avaliação por meio da esofagogastroduedenoscopia. A colher tinha 19 cm de comprimento, e a concha da colher media 6,5 x 4 x 0,5 cm em sua maior dimensão.

Por sorte, a colher não inclinou o suficiente para vedar completamente o fluxo aéreo pelo trato respiratório. Não foi citado pelo periódico a evolução do caso. Acredito que este possivelmente evoluiu com manutenção do quadro disfágico e instalação do quadro de disfonia, decorrentes da lesão gerada tanto pela colher quanto pelo inserção do forceps. Pensando que o tempo no qual o paciente permaneceu em dispneia não foi suficiente para provocar uma lesão a nível neurológico, acredito que o quadro será temporário e reversível após algumas sessões fonoterápicas.



Referência Bibliográfica: Ramadan and El-Desouky 361 (7): e11, Figure 1 August 13, 2009. Images in Clinical Medicine. Available at http://content.nejm.org/cgi/content/full/361/7/e11/F1

sábado, 25 de julho de 2009

Obrigada

Um agradecimento às minhas companheiras de estágio do Grupo G3, incluindo a Professora Cynthya Coradi, com as quais aprendi muito e compartilhamos ótimos momentos juntas!

Para

Jéssica, Ana Amélia, Marta, Fernanda, Liliana, Cynthya, Marília, Camila, Lívia, Núbia, Lucília, Sabrina, Janaína, e Nayra,

Meu Muito Obrigada!


O lado humano do Fonoaudiólogo e o lado Fonoadiológico do ser Humano

De autoria desconhecida, este poema encanta todos os profissionais e estudantes envolvidos com a Fonoaudiologia. Não poderia deixar de compartilhá-lo com aqueles que ainda não o conhecem por meio do meu blog.

Fono não fala: Comunica-se;
Fono não engole sapo: Deglute o bolo alimentar;
Fono não dá um jeitinho: Faz manobra de facilitação;
Fono não faz cara feia: Muda a expressão facial;
Fono não chora: Aumenta a secreção;
Fono não dá ataque: Tem distúrbio de conduta;
Fono não tem idéia: Tem plano terapêutico;
Fono não conclui: Faz relatório de avaliação;
Fono não se engana: Tem ato falho;
Fono não muda de interesse: Muda de estratégia;
Fono não ri: Faz mioterapia;
Fono não abraça: Faz estimulação corporal;
Fono não ouve: Produz ondas eletrofisiológicas;
Fono não solta a voz: Faz vibração de Pregas Vocais;
Fono não perde ar: Entra no ar de reserva;
Fono não escreve: Faz transcrição fonética;
Fono não lê: Tem consciência fonológica;
Fono não brinca, isso é terapia;
Fono não se despede: Dá alta parcial;
Fono não é fonoaudiólogo, é fono....

Autor desconhecido

quarta-feira, 6 de maio de 2009

I Seminário Multiprofissional de Atuação Escolar de Belo Horizonte

Para aqueles interessados em Fonoaudiologia Escolar, acontecerá nos dias 15 e 16 de maio um grande encontro entre Fonoaudiologia e Educaço conforme cartaz em anexo. A inscrição é grátis, vale a pena conferir! Segue abaixo alguns dos palestrantes confirmados:

- Fgo. Jaime Zorzi (SP)
- Prof. José Pacheco (Portugal)
- Cláudio Alexander Deiran Rodrigues (BH)
- Fga. Carla Menezes (PUC MINAS)
- Fga. Salete e Letícia Maria de Paula Silva (Brincar)
- Ricardo Correa Coelho (MEC)
- Márcia Amaral
- Girleine A. Medeiros Teixeira (Avivar)
- João Andrade
- Profª Maria do Carmo Menicucci (PUC Minas)
- Profa. Leonor Guerra
- Fga. Cláudia Machado Siqueira
- Fga. Luciana Mendonça
- Fga. Adriana Vanísia
- T.O. Nivania M Melo Reis
- Adriana Cançado
- Prof. Dr. Joe Garcia (Curitiba)
- Jane Patrícia Haddad

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Uma entrevista sobre a intervenção terapêutica nos Estados Unidos com crianças no espectro autista

O Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (TDI) refere-se a um espectro de condições psicológicas caracterizado por anormalidades geradas na interação social, comunicação e comportamento. TDI por si só não é considerado um diagnóstico; entretanto, é um elo de classificação comum para Autismo, Síndrome de Asperger, Síndrome de Rett e Transtorno Invasivo do Desenvolvimento-Sem outra especificação (TDI-SOP). Estes, sim, são diagnósticos e têm como características em comum debilidades no processo de socialização e no uso da função linguística, assim como apresentação de comportamentos estereotipados.

A compreensão do TDI, especialmente das Desordens do Espectro Autista (DEA) tem sido meu objeto de investigação principal. Muito tenho estudado e visto sobre as alternativas de tratamento e a intervenção da Fonoaudiologia sobre os casos caracterizados dentro das DEA. Em uma temporada nos Estados Unidos, aprendi sobre a intervenção baseada na “Análise Comportamental Aplicada” (ABA)(1), fundamentada na idéia de que o comportamento pode ser moldado e controlado. O método ABA tem sido utilizado em larga escala como metodologia de estimulação e tratamento individual de casos diagnosticados dentro do TID, dos quais representam, na estimativa atual, 1:150 das crianças americanas.

Para compartilhar um pouco do que aprendi nos Estados Unidos sobre intervenção terapêutica com crianças diagnosticadas sob DEA, apresento abaixo a minha entrevista com Nicole Narlock, diretora assistente da Pacific Autism Learning Services, uma agência de serviços terapêuticos, baseados no método ABA, para crianças diagnosticadas neste espectro.


1. Como você ajuda crianças autistas?

“Eu sou diretora assistente de uma organização chamada Pacific Autism Learning Services (PALS). Nós oferecemos intervenção precoce, terapia ABA de julgamento discreto, para jovens crianças com autismo. Nossos serviços são oferecidos em ambiente domiciliar e tem foco na construção da linguagem e das habilidades comunicativas, cognitivas e acadêmicas, da independência pessoal, e da habilidade de brincar e socializar. Nós também acompanhamos nossas crianças em idade pré-escolar no ambiente escolar, facilitamos a socialização entre os colegas e oferecemos suporte quanto ao comportamento. Como diretora, eu assisto 11 crianças, acompanhando estes casos por aproximadamente 1,5 hora/ semana através de encontros com minha equipe.”

2. Qual é a sua formação?

“Eu me formei na Santa Clara University, com um título em Estudos Liberais. Atualmente, estou em processo de finalização do meu título de mestrado em Educação Especial – Deficiência Leve a Moderada pela San Francisco State University (vou obtê-lo em Janeiro de 09). Além disso, estou finalizando uma especialização em Autismo através do programa Project Mosaic sobre a orientação de Pamela Wolfberg, Ph.D.”

3. Por que você se interessou por essa área?

“Depois de completar o meu bacharelado, eu estava inicialmente interessada em me tornar uma professora da educação especial. Depois que começei a buscar o meu mestrado, encontrei um trabalho de meio turno em um jornal como uma terapeuta ABA iniciante. Eu me apaixonei por este trabalho e já tem 9 anos que continuo neste campo.”

4. Como você conseguiu este trabalho? Você já tinha trabalhado com crianças autistas anteriormente?

“Como disse anteriormente, depois de encontrar o emprego no jornal, me candidatei para começar a trabalhar como uma terapeuta ABA iniciante. Desde então tenho trabalhado em duas diferentes empresas e fui promovida como terapeuta senior, supervisora clínica, e agora sou diretora do programa. Eu não tinha nenhuma experiencia com autismo antes de começar nesta área.”

5. Como uma criança autista precisa e pode ser assitida? Quais são as necessidades dela?

“Crianças com autismo tipicamente apresentam deficit em quase todas as áreas de funcionalidade. Estas incluem a comunicação, independência pessoal e adaptação, deficit cognitivo, brincar e imaginação, atenção articulada, deficits sensoriais, e habilidades acadêmicas. Qualquer intervenção precisa ter essas áreas como foco. O autismo é, entretanto, um espectro de alterações, o que significa que os sintomas variam em diferentes níveis de severidade de acordo com peculiaridades individuais. Crianças com autismo frequentemente apresentam comportamentos alterados, incluindo estereotipias, auto-agressão ou agressão contra outros, e desobediência. Muitos também se mantém em comportamentos de auto-estimulação.”

6. O que um profissional especializado pode fazer por uma criança autista que os pais desta não podem fazer por ela?

“Pais sempre conhecem os filhos melhor do que ninguém; entretanto, profissionais especializados podem certamente acrescentar com a experiência e conhecimento deles. Dependendo da formação, assim espero, podem oferecer serviços muito úteis não somente para as crianças, mas também para os pais destas. Profissionais experientes devem ajudar a ensinar aos pais como difundir as habilidades adquiridas pela criança e oferecer caminhos de sucesso para favorecer na interação com a criança.”

7. Quais são as dificuldades encontradas na relação entre pais e profissionais?

“Como em qualquer relação profissional, às vezes pais e profissionais também enxergam de maneira diferente uma situação. Durante minha carreira, vivi dificuldades com pais que negam ou que apresentam dificuldade para lidar com o diagnóstico da criança. Isso pode se manifestar através do não seguimento de recomendações dadas ou da acusação de que a falta de progresso no tratamento da criança é culpa dos profissionais. Ocasionalmente, pais ficam confusos, divididos entre recomendações conflitantes entre diferentes prestadores de serviço e enfrentam dificuldade confiando em um certo profissional. Outras vezes, já fui confrontada por pais que não seguiram as minhas recomendações e encararam nossos serviços como baby-sitting. Geralmente, tenho me tornado amiga da maioria dos pais com os quais eu trabalhei e, acredito, as dificuldades enfrentadas foram mínimas.”

8. O que você acha sobre a incidência de autismo na California? E em relação a esta incidência nos Estados Unidos?

“Desde que desconhecemos a causa do autismo, eu certamente não posso fazer nenhuma conclusão sobre o drástico aumento desta incidência no nosso país (EUA). Fatores que eu acredito estarem relacionados são o aumento da consciência geral das pessoas, melhores métodos diagnósticos, e detecção precoce. Da mesma forma, a população de autistas tem continuado a crescer. Crianças com a forma hiperfuncional de autismo, como nos casos da Síndrome de Asperger, têm sido diagnosticadas de maneira mais clara e precoce, expandido as formas de autismo e aumentando as estatísticas. Também tem se tornado mais aceito o fato de que existem fatores ambientais conectados com o aumento do autismo, mas minha formação ainda não me direcionou na investigação destes fatores e não posso relacioná-los com minha experiência.”

9. Existe pessoal suficiente para dar assistência às crianças autistas no mercado? O que você pensa sobre o mercado profissional nesta área?

“Eu penso que o aumento na incidência de autismo tem levado a excitação de novas terapias e intervenções, deste modo também criando potencialmente mais empregos. Eu acredito que qualquer indivíduo dedicado, que queira ajudar crianças com autismo, poderia encontrar um lugar neste mercado. Este é um momento interessante na área, no qual autismo ainda continua sendo um mistério em diversos pontos de vista. Até que a cura ou causa seja identificada, eu penso que o mercado vai continuar a crescer e a expandir, à medida da necessidade. Na minha própria posição de trabalho e na minha especialidade parece termos, atualmente, pessoal suficiente para ajudar crianças com autismo. Nos últimos anos, agências de ABA na região têm se multiplicado de maneira grandiosa e atualmente o mercado tem se tornado de certa forma competitivo. Enquanto antigamente nós costumávamos ter longas listas de espera de famílias tentando entrar no nosso programa, mais recentemente este não tem sido mais o caso. Novamente, eu penso que isso acontece tanto por causa do aumento da oferta de agências como também porque os pais estão buscando diferentes tipos de terapias, além de exclusivamente a nossa.”

10. Você pensa que o pessoal está preparado para dar assistência às crianças autistas? Como eles podem se preparar? Quais devem ser os pré-requisitos educacionais e profissionais?

“Dependendo da expêriencia e nível de formação do profissional, eu penso que muitas pessoas chegam com boa preparação para trabalharem com crianças autistas. Infelizmente, formação específica em autismo é ainda relativamente uma novidade. Programas como os que estou envolvida na San Francisco University ainda são raros. Com a crescente melhora na consciência das pessoas, programas na área de educação especial estão, no entanto, começando a incluir mais fundamentação e assuntos de interesse relacionados ao autismo, o que é certamente um passo na direção correta. Se alguém está interessado em trabalho na área de autismo, eu recomendaria que ele primeiro pesquisasse sobre a variedade de abordagens disponíveis e veja quais são os programas mais interessantes numa perspectiva pessoal. Depois, eu veria as ofertas de emprego disponíveis naquela área em particular e começar “enfiando o meu pé” por aí! Na minha opinião, experiência é a melhor professora. Da mesma forma, os programas em educação especial e/ ou autismo podem oferecer uma boa base de conhecimento também.”

11. Quais características pessoais são essenciais num profissional que lida com crianças autistas?

“Primeiramente e essencialmente, eu penso que qualquer profissional que tenha dedicação pode ir longe, lidando com crianças autistas. Qualquer um que tenha sensibilidade e dedicação pode realmente ajudar e, acredito, pode, desta maneira, fazer uma carreira de sucesso nessa área. Além disso, acho que a pessoa tem que ter mente aberta, ser paciente, ter compaixão, e empatia pelas dificuldades enfrentadas por essas crianças e pelas famílias dela. Sempre respeitá-los é essencial ao meu ver.”

12. Qual conselho você daria às pessoas interessadas em trabalhar com crianças autistas?

“Eu penso que eu gostaria que eles soubessem quão maravilhosas as crianças com autismo são. Elas são todas incrivelmente únicas e maravilhosas de se trabalhar. Eu também gostaria que eles soubessem, entretanto, que a experiência pode ser difícil. Agressão é comum, e as vezes é difícil lidar com a auto-agressão. Eu gostaria de encorajá-los a ter uma mente aberta e tirar máximo proveito desta experiência.”



(1) ABA refere-se à Applied Behaviour Analysis, termo utilizado no inglês

sábado, 31 de janeiro de 2009

O Escafândro e a Borboleta




Gostaria de indicar a leitura do livro francês O Escafandro e a Borboleta. Escrito pelo então editor da revista francesa Elle, Jean-Dominique Bauby, o livro já recebeu diversos prêmios, inclusive de livro internacional mais vendido nos Estados Unidos. Trata-se do testemunho de Bauby diante de seu quadro neurológico; ele foi acometido por um acidente vascular encefálico (AVE)(1) aos 43 anos de idade. Como sequela, ele se tornou portador da “locked in syndrome”. O quadro é caracterizado por quadriplegia (2) e pela preservação da capacidade intelectual do paciente, que se mantém plenamente consciente. A “locked in syndrome”, também conhecida no Brasil como “Síndrome do Encarceramento”, é assim denominada para descrever que o paciente apresenta-se aprisionado dentro de seu próprio corpo, sem poder se mover ou falar.

Bauby aprendeu a se expressar com a ajuda de um código de comunicação desenvolvido por sua fonoaudióloga. Por ordem de uso na língua francesa, o alfabeto foi reorganizado da seguinte maneira: E S A R I N T U L O M D P C F B V H G J Q Z Y X K W. Com a ajuda de um emissor, que era muitas vezes o próprio receptor da mensagem, o alfabeto era assim soletrado para Bauby até que ele indicasse com o piscar do olho, um dos poucos movimentos preservados, qual letra queria usar para formar a palavra almejada. Por exemplo, se Bauby quisesse o nome da revista que ele trabalhou, ele iria piscar quando a letra E fosse falada pelo emissor. Em seguida, o emissor iria soletrar o alfabeto novamente. Bauby iria piscar quando a letra L fosse falada. Novamente o alfabeto seria soletrado e ele iria piscar quando a letra L fosse falada denovo. Restando apenas o E, ele iria piscar logo que o emissor começasse a soletrar o alfabeto novamente. Aí temos a formação da palavra ELLE. Com o passar do tempo, os receptores da mensagem já conseguiam completar o sufixo de muitas palavras automaticamente, e, mais uma vez utilizando códigos baseados no piscar do olho esquerdo, Bauby iria confirmar Sim ou Não.

Complicado? Um pouco, mas esse sistema levou Bauby a se comunicar com o mundo inteiro e compartilhar sua experiência de vida escrevendo o livro O Escafandro e a Borboleta. Ele faz referência ao trabalho realizado pela fonoaudióloga com admiração e gratidão. Existe um capítulo inteiro dedicado à Sandrine, a fonoaudióloga, também denominada por ele de anjo guardião. Ele diz sobre a Fonoaudiologia, “é uma arte que merece ser mais amplamente conhecida. Você não pode imaginar as acrobacias que sua língua mecanicamente executa para produzir todos os sons da linguagem”.

Nos casos de apraxia(4), realizar acrobacias com a língua pode ser possível novamente graças à plasticidade cerebral e com a realização de exercícios fonoarticulatórios miofuncionais orientados pelo fonoaudiólogo. Objetivar a reabilitação da fala, entretanto, não é uma meta atingível para todos. Possibilitar um meio de comunicação efetiva para o paciente deve ser tomado como o objetivo geral da fonoterapia; a partir daí encontramos os sistemas de comunicação alternativa como ferramentas aliadas ao processo de reabilitação, principalmente o uso de pranchas com símbolos pictográficos.

Outras passagens que me chamaram atenção enquanto Fonoaudióloga foi quando Bauby descreveu seu quadro disfágico (3). Coloco aqui uma passagem representando os sentimentos dele diante da disfagia: “Bon apeptit! – era o jeito dele (o enfermeiro ao deixar o quarto) me dizer “te vejo amanhã”. E, claro, me desejar bom apetite é quase a mesma coisa que me desejar “Feliz Natal” no dia 15 de Agosto, ou dizer “Boa noite” em plena luz do dia. Nos últimos oito meses, eu tenho engolido nada mais do que alguma gotas de água saborizada de limão e meia colher de sopa de iogurte, do qual gorgolejo ruidosamente pela minha traqueia. O teste de deglutição, como eles grandiosamente chamam esse banquê – não foi bem sucedido. Mas não vou me alarmar: Eu não estou faminto. Por meio de um tubo enfiado no meu estômago, dois ou três pacotes de um fluido amarronsado garante minhas necessidades calóricas diárias. Por prazer, eu tenho tornado minhas vívidas memórias dos sabores e cheiros, numa incansável reserva de sensações.” Interessante também notar que o tratamento de disfagia, de acordo com o livro, foi então realizado pela Terapeuta Ocupacional. Aqui fica um momento para refletir sobre as diferenças encontradas na distribuição de responsabilidades entre profissionais no Brasil e na França.

Tantas outras passagens são valiosas para se fazer uma reflexão sobre o valor da vida e do significado de felicidade, que podem ser encontradados no próprio cotidiano ou na habilidade de executar funções essenciais do corpo como comer, ouvir, falar, e andar. Infelizmente, muitos são os que aprendem a dar valor a vida apenas depois de uma tragédia.

A história de Bauby pode ser também conferida em versão visual. O autor teve sua história contada no filme que leva o mesmo nome do livro. O filme O Escafandro e a Borboleta recebeu várias indicações ao Óscar e ganhou, dentre outros prêmios, dois Globos de Ouro.




(1) diagnóstico de AVE é popularmente conhecido como derrame.
(2) Acometimento definitivo da habilidade motora do corpo, da cabeça aos pés.
(3) É um distúrbio da deglutição no qual o portador é privado de alimentar-se via oral de maneira segura. podendo, por isso, se asfixiar ou comprometer a integridade funcional dos pulmões. Este sintoma é característico de patologias diversas, dentre elas Alzheimer, Esclerose Lateral Amiotrófica, Parkinson, ou uma sequela de acidentes vasculares, traumatismos cranianos, câncer, e ainda é um quadro comum em bebês prematuros ou crianças acometidas com paralisia cerebral.
(4) Diz-se das alterações ou perda da função articulatória da fala secundária a lesões cerebrais.