Microfonia Coclear: Não dá para confiar só na EOA! Mas que é lindo de se ver o funcionamento do corpo humano, isso é! |
A gente já nasce e tem que "passar" em um monte de teste. Hoje em dia o recém-nascido (RN) passa por várias triagens, com o objetivo de verificar doenças, deficiências ou alterações que possam ser diagnosticadas e tratadas precocemente. Começou com o "Teste do Pezinho" e agora já temos o "da Orelhinha", "do Olhinho", "da Linguinha", "do Coraçãozinho"... Certamente, são avanços da medicina que vieram para promover o desenvolvimento biopsicosocial saudável da criança.
A regularização e, portanto, obrigatoriedade das triagens dos recém-nascidos nos hospitais públicos e privados demandou muitos estudos e discussões, com vistas a identificar a relevância e a viabilidade dos exames de triagem do RN. Pesquisadores, políticos e entidades de classe - por exemplo, as Sociedades Brasileiras de Fonoaudiologia, Otorrinolaringologia, Pediatria, Oftalmologia, Cardiologia - precisaram se unir para regulamentar os projetos de leis voltados à saúde da criança. Hoje, temos grandes conquistas, e me orgulho por poder participar da prática, das discussões, pesquisas e regulação do Programa de Triagem Auditiva Neonatal em Minas Gerais.
O que me preocupa, entretanto, são os hospitais e serviços que estão realizando a Triagem Auditiva Neonatal, o famoso "Teste da Orelhinha", sem os critérios clínicos estabelecidos, visando apenas cumprir a lei ou garantir mais uma forma de lucro. Na prática, vejo no Serviço de Diagnóstico Audiológico Infantil onde eu trabalho, onde recebemos para diagnóstico as crianças que falharam à triagem, que alguns profissionais estão despreparados para desempenhar essa importante tarefa.
As diretrizes recomendadas pelo Joint Committee on Infant Hearing (JCIH) e Comitê Multiprofissional de Saúde Auditiva (COMUSA) devem ser criteriosamente seguidas. É importante invenstigar com propriedade a presença de Indicadores de Risco para a Perda Auditiva. Consanguinidade, Hiperbilirrubinemia com Transfusão Extrasanguíneo e Antecedentes Familiares com Perda Auditiva, por exemplo, são frequentemente despercebidos. A identificação de tais indicadores é muito importante, pois as crianças que os apresentam necessitam retornar para consultas de acompanhamento do desenvolvimento auditivo, mesmo quando apresentam resultados normais à TAN. Apesar da cóclea, órgão sensorial da audição, estar completamente desenvolvido desde a vida intra-uterina, a maturação das vias auditivas centrais inicia-se após o nascimento e completa-se por volta dos 18 meses de vida pós-natal. Por isso, é possível desenvolver alterações auditivas após o nascimento, que podem não ser inicialmente perceptíveis ao olhar dos pais.
Me preocupa, sobretudo, os serviços que estão realizando a TAN utilizando-se exclusivamente da pesquisa das Emissões Otoacústicas Evocadas (EOA). A observação de respostas comportamentais auditivas, especialmente a pesquisa do Reflexo Cócleo-Palpebral (RCP) é de suma relevância e é diretriz definida pela COMUSA. Atenção, mamães!!! Ao acompanhar seus nenéns ao Teste da Orelhinha, observe ou pergunte sobre o "barulho que faz o neném piscar"! Outro dia, recebemos no nosso serviço, uma criança que passou no Teste da Orelhinha, realizado exclusivamente com a pesquisa das EOA. Os pais, que já tinham uma outra criança com deficiência auditiva, atentaram-se ao comportamento auditivo atípico da criança e nos procuraram mesmo com os resultados "normais" à TAN. Após uma série de exames - EOA Transientes presentes, RCP ausente, Respostas Comportamentais Auditivas Inadequadas para Sino, Ausência de formação de ondas I, III e V ao PEATE com presença de Microfonia Coclear - identificamos nela a presença do que chamamos de Neuropatia, ou seja, uma Perda Auditiva Central. Dentre as perdas auditivas, o prognóstico é um dos mais reservados. É preciso tratamento intenso para estimular a oralidade por leitura orofacial. Em alguns casos, o Implante Coclear também pode ser uma alternativa terapêutica.
A história me comoveu; fico triste em saber que, se o RCP tivesse sido pesquisado, o diagnóstico poderia ter sido fechado mais precocemente. Por isso, faço este apelo aqui no blog:
Se for fazer Teste da Orelhinha, que seja bem feito!
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